A chamada “Reforma Trabalhista” trouxe uma inovação bastante interessante, permitindo que as empresas possam pagar prêmio a seus empregados, os quais não integram a remuneração do empregado, nos termos dos §§ 2º e 4º do art. 457 da Consolidação das Leis do Trabalho e não constituem base de contribuição previdenciária, conforme letra “z” do § 9º do art. 28 da Lei 8212/91, reduzindo os custos do empregador, especialmente em relação a encargos.
Evidentemente há regras para pagamento dessa premiação, não podendo ser pago o prêmio de forma indiscriminada, pois se assim for, pode ser considerado salário ou comissão disfarçados, o que geraria enorme passivo.
Assim, é possível criar, no âmbito das empresas, um Programa de Premiação, de modo a adequá-lo às premissas legais, reduzindo, substancialmente o risco de ser declarada a natureza salarial dessa verba e determinada a sua integração à remuneração.
A nova legislação prevê que o “prêmio” não se integra à remuneração e ainda define o que é o prêmio, como sendo “as liberalidades concedidas pelo empregador em forma de bens, serviços ou valor em dinheiro a empregado ou a grupo de empregados, em razão de desempenho superior ao ordinariamente esperado no exercício de suas atividades”.
Além disso, poderá ser um mecanismo de retenção de talentos, pois sabendo que podem receber prêmios, os empregados tendem a permanecer no emprego, na medida em que a remuneração global fica muito mais atraente.
Concluímos salientando que a criação de Programa de Premiação pode trazer as seguintes vantagens ao empregador:
Os prêmios, desde que efetivamente prêmios (e não salário ou comissões disfarçados) não integram a remuneração e nem constitui base de incidência de qualquer encargo trabalhista (será devido recolhimento de Imposto de Renda, mas esta obrigação, em última análise, é do próprio trabalhador), não se lhe aplicando o princípio da habitualidade, ou seja, só é devida enquanto perdurar a vigência do Programa que o instituiu.
Para efeito de apuração do lucro real, a pessoa jurídica poderá deduzir como despesa operacional o prêmio pago.
Se a empresa já possui alguma forma de pagamento de premiação poderá adequá-la a nova legislação, reduzindo seu risco de eventuais passivos.
Com a criação de um regramento para a premiação, a aumento significativo na segurança jurídica à empresa, no sentido de minimização de riscos e passivos.
Pode se constituir em ferramenta de retenção de talentos.
Muito se tem falado sobre ESG, mas o que é isso e como isso se relaciona com o negócio do Concessionário de Veículos?
A sigla vem do inglês Environmental, Social e Governance e no Brasil é referida como ASG, correspondendo às práticas e critérios ambientais, sociais e de governança aplicados e mensurados pelas empresas ou instituições.
O tema surgiu a partir de um relatório feito pelo Pacto Global, braço da Organização das Nações Unidas (ONU), que visava definir diretrizes globais para boas práticas ambientais, sociais e de governança corporativa.
Os critérios ESG relacionam-se diretamente aos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) que fazem parte da Agenda 2030 pactuada globalmente pelos Países membros da ONU e que apontam as principais dificuldades a serem superadas, global e socialmente visando uma sociedade sustentável.
O objetivo principal dos critérios ESG, considerando sua abrangência, é avaliar o grau de conformidade de uma empresa aos aspectos ambientais, sociais e de governança, sendo ele utilizado como um indicador para tal avaliação.
Essa mensuração da conformidade da empresa aos critérios ESG reflete-se, diretamente, no valor da empresa como um todo já que quanto maior for a aderência da empresa a tais critérios, menor o risco que a empresa representa para cada um de tais critérios.
Ou seja, e exemplificativamente, uma empresa com aderência relevante aos critérios ESG terá menor risco de envolver-se em alguma ocorrência que acarrete dano ambiental, já que ela terá incorporado em suas atividades normas e procedimentos que visam, justamente, a manutenção sustentável do meio ambiente. Do mesmo modo, e ainda exemplificativamente, terá um menor risco de envolver-se com denúncias de corrupção ou prática de atos que podem ser considerados ilegais, já que terá implementado práticas adequadas de governança e compliance, que dificultarão tais ocorrências. Da mesma forma, o risco por eventual não conformidade com situações que possam ser consideradas como excludentes de algum grupo social, também serão minoradas já que a empresa terá adotado procedimentos para evitar tais situações.
Mas não é somente sobre procedimentos internos adotados pela empresa que se constitui a ESG. A depender da atividade e tamanho da empresa, os critérios podem abranger atitudes que extrapolam o dia a dia da empresa, como, por exemplo, a plantação de área verde para minimizar eventual produção poluidora decorrente das atividades da empresa ou, ainda, eventual atuação efetiva e positiva socialmente para o entorno da empresa. Enfim, são inúmeras as possibilidades e caminhos para implementação e atingimento de critérios ESG de uma empresa.
Como dito acima, quanto maiores os indicadores ESG de uma empresa, maior seu valor global e, portanto, melhor o seu grau de investimento e de análise de risco. O mercado financeiro tem investido em empresas sustentáveis – grandes, médias ou pequenas – exigindo conformidade com ESG e as empresas, em forma de cadeia, exigem que seus fornecedores também atendam tais critérios. E assim, as empresas vão agindo de forma a construir sociedades sustentáveis que, como em círculo, manterão as empresas saudáveis e existentes ao longo do tempo.
Vê-se, portanto, que a implementação de ESG na empresa indica que a empresa possui uma estrutura sólida, com maior possibilidade de retorno financeiro, com melhor conceito, e, portanto, com maior condição de suportar momentos de incertezas e dificuldades.
Importante mencionar, ainda, que o público consumidor, cada vez mais busca um consumo consciente, valorizando marcas e empresas que atuam de forma sustentável, transparente, com respeito aos diferentes grupos sociais, ao meio ambiente, aos próprios colaboradores, e a todo o entorno da atividade empresarial.
E, quanto maiores os índices ESG de uma empresa, maiores ficam atingidos os temas e preocupações da sociedade atual, agregando valor à marca, ao nome e ao produto da empresa, valorando-a pela sua conduta responsável ambiental, social e governamental.
Tem-se, portanto, que o ESG é uma enorme oportunidade de crescimento, consolidação e valoração do negócio empresarial, principalmente considerando-se estar ele relacionado às necessidades globais da sociedade contemporânea expostas nos 17 ODS, havendo grandes possibilidades de estruturação para sua implementação.
No que tange à concessão comercial de veículos, temos visto o surgimento de conversas iniciais sobre o tema em algumas marcas, ainda incipientes mas que acreditamos irão se aprofundar e tornar-se uma realidade nas redes, levando-se em consideração, principalmente, o fato das concessionárias representarem a marca da Concedente.
Desse modo, entendemos relevante que as redes comecem a se inteirar do tema para prepararem-se para essa nova possível demanda que surgirá.
Como é sabido a Covid-19 tem afetado gravemente todos os setores da economia, inclusive os esportes no geral. No Brasil, o esporte que movimenta maior quantidade de dinheiro é o futebol, tendo, em 2018, movimentado cerca de 52,9 bilhões de reais, o que representa 0,72% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, segundo estudo feito pela Ernst & Young Global Limited a pedido da CBF, para analisar toda a cadeia produtiva e impacto do futebol[1].
A Covid-19 interrompeu os campeonatos de futebol em quase todo o planeta. Como não são realizados jogos, não há transmissão de televisão e, consequentemente, as maiores fontes de renda dos times diminuem ou ficam zeradas (direito de transmissão televisiva[2] e venda de ingressos para os jogos).
Além disso, outras fontes de renda dos clubes brasileiros de futebol são a venda de jogadores para outros clubes e a venda de materiais esportivos (ex. camisas). Ambas estão muito prejudicadas uma por conta da própria diminuição da renda dos clubes (que neste caso evitam realizar negociações) e outra pelo fechamento dos comércios e isolamento social. É importante ressaltar que as pessoas, no geral, estão economizando mais dinheiro para o momento de crise, deixando de comprar o que não é extremamente necessário.
Certo é que não é possível precisar o valor da perda de faturamento dos clubes. Todavia, evidentemente esta perda será gigantesca e afetará a todos. Sendo assim, é importante, mais do que nunca, para os clubes gerar novas receitas.
Nesse sentido, percebemos que os esportes eletrônicos mantêm e até aumentam o seu alcance no contexto atual, na medida em que, com a impossibilidade de locomoção por causa da Covid-19, os serviços online dispararam em utilização. Isso se confirma com a grande alta na demanda e nos preços das ações de alguns serviços de Streaming tais como Netflix e Amazon Prime[3].
No Brasil, poucos times possuem uma equipe realmente atuante nos esportes eletrônicos ou e-Sports. Foi criada apenas em 16 de abril de 2020 pela CBF a Seleção Brasileira de e-Sports[4].
No resto do mundo muitos clubes profissionais de futebol possuem equipes de e-Sports para representa-los e essas equipes já movimentam bastante dinheiro. Para um momento como o atual, em que há a paralisação do futebol, uma boa fonte de receita para os clubes poderia ser o investimento em e-Sports, embora os valores movimentados nas plataformas eletrônicas e o futebol ainda não possam ser comparados.
Os e-Sports despontam como importante fonte de renda para os clubes nos próximos anos. O relatório de 2018 Global E-Sports Market Report, da Newzoo demonstra que, globalmente, o mercado dos e-Sports movimentou US$ 1,1 bilhão em 2019 e deveria se aproximar do US$ 1,5 bilhão este ano, sendo que em um cenário mais promissor poderia chegar a US$ 3.2 bilhões[5]. Ainda pequeno em relação ao futebol, mas que pode garantir boa arrecadação aos clubes e ainda com enorme potencial de crescimento.
Vale mencionar que o número final deverá ser próximo do valor tido como promissor por conta da quarentena forçada pela Covid-19 que, como já dito, fez o mercado de jogos eletrônicos no geral crescer ainda mais.
Hoje, no Brasil, não há regulamentação clara acerca da natureza jurídica que se aplica ao praticante de e-Sports: ele se enquadra como trabalhador comum? Como atleta?
Há no Congresso Nacional alguns projetos de lei, sendo que cada um trata o e-Sports de uma determinada maneira, como será aqui abordado.
Os Projetos de Lei 3450/2015 e 7747/2017 basicamente incluem um artigo na Lei 9.615 1998 (Lei Pelé) reconhecendo o e-Sports como esporte. Já o Projeto de Lei do Senado 383/2017 dá a definição do que é o e-Sports, e estabelece que o jogador tem que se considerado atleta.
Este projeto tem enfrentado grande discussão uma vez que dispõe que não será considerado esporte eletrônico o jogo com conteúdo violento ou de cunho sexual, que propague mensagem de ódio, preconceito ou discriminação ou que faça apologia ao uso de drogas. E se não é esporte, seu praticamente não pode ser reputado atleta.
Com o texto legal proposto, não restam dúvidas de que os jogos das categorias “First Person Shooter” e “Third Person Shooter” (jogos de tiro de pessoa contra pessoa que contém, portanto, conteúdo violento) não se enquadrariam na categoria de e-Sports, e a nosso ver, como consequência, seu praticamente não será considerado atleta. Importante informar que o cenário competitivo de jogos dos tipos mencionados é um dos grandes motores do e-Sports, contando com jogos de extrema relevância (e, por consequência, faturamento) no cenário atual, tais como: Fortnite, Counter-Strike: Global Offensive, Overwatch, Tom Clancy’s Rainbow Six Siege, etc. Sendo assim, esse Projeto de Lei do Senado é extremamente controverso no mundo gamer. A título de exemplo, hoje as 3 maiores equipes de e-Sports do mundo têm como alguns de seus jogos bases um ou mais dos jogos citados acima, entre outros com conteúdo violento.
Não obstante em 2019 o jogo mais rentável dentre todos foi o Fortnite[6], jogo de tiro do estilo “Battle Royale” que consiste em 100 jogadores caindo em uma ilha, batalhando entre si, sendo que o último sobrevivente é o vencedor, desta forma é considerado violento pelo Projeto de Lei do Senado. Tendo inclusive distribuído cerca de US$100.000.000 em prêmios no ano de 2019[7].
Segundo a Forbes[8] essas 3 maiores equipes de e-Sports do mundo são a Cloud9 (US$ 400 milhões), a Team SoloMid (US$ 400 milhões) e a Team Liquid (US$ 320 milhões). Os valores apesentados representam o valor de mercado das respectivas equipes.
Como se pode ver, o fluxo de dinheiro movimentado pelo mercado de jogos eletrônicos é gigantesco, mas ainda assim os atletas não têm uma definição legal de sua atividade ou qualquer lei que específica que os proteja.
No Brasil, os atletas de e-Sports enfrentam dificuldades em exercer sua profissão, já que, como dito não há qualquer regulamentação e, por isso, nem é tratada efetivamente como profissão. Sendo assim, como os e-Sports não foram regulamentados como desporto, existe ainda a insegurança se os atletas podem ser enquadrados na Lei 9.615/98 (Lei Pelé). Ou mesmo se são considerados trabalhadores comuns, regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Ademais, no mundo dos e-Sports, as equipes normalmente dispõem de uma casa (Gaming House) que serve como centro de treinamentos e muitas vezes de alojamento, de modo que os atletas se mudam para este local.
Para caracterização de vínculo empregatício, de acordo com a CLT, são necessários cumulativamente os seguintes requisitos: habitualidade, onerosidade, pessoalidade e subordinação jurídica e, na nossa visão, os atletas estão propensos ao reconhecimento no vínculo, já que os ditos requisitos nos parecem cumpridos.
Senão vejamos, a habitualidade é clara uma vez que os atletas têm a necessidade de comparecer aos treinos além de, em alguns casos, morarem na Gaming House.
A onerosidade também é outro dos requisitos preenchidos já que o atleta recebe pagamento (salário) além de outras remunerações, tais como o direito de imagem.
A pessoalidade também é outro requisito cumprido, já que o atleta é insubstituível por suas habilidades específicas.
Por fim, a subordinação jurídica está presente na medida em que o atleta deve realizar os treinos determinados pela equipe, têm que ir aos eventos, igualmente determinados pela equipe, deve ser exclusivo deste time. E, por fim, mas não menos importante, há efetivamente um grupo de pessoas controlando diretamente cada atleta.
Assim, qualquer prática abusiva das equipes perante os atletas nos parece que geraria direito de indenização perante a justiça do trabalho. Essas práticas podem ser por exemplo: carga horária maior do que a lei permite sem pagamento de hora extra, não utilizar equipamentos corretos (cadeira, mesa, etc) para segurança médica do atleta, etc.
Ademais, é importante ressaltar que o atleta profissional, segundo a Lei Pelé, possuí direito ao salário e FGTS sobre ele, ao repouso semanal de 24 horas ininterruptas, férias anuais de 30 dias com o acréscimo do respectivo terço constitucional, 13º salário e jornada de trabalho de 44 horas semanais, além disso, este deve ter o registro de sua atividade realizado na sua Carteira de Trabalho e Previdência Social
Não obstante, ressalvadas as peculiaridades de cada esporte e as decorrentes da remuneração estabelecidas na Lei Pelé, o atleta profissional deverá protegido pelas normais gerais trabalhistas e da seguridade social, de forma subsidiária, tal qual preceitua a Lei.
Desta forma, o fato do jogador de e-Sports morar na casa em que ocorrem os treinos dificulta a manutenção dos direitos, além disso, soma-se o fato de o atleta poder usar seu tempo de descanso jogando por diversão. Caso isso ocorra, como controlar se o período jogando é treinamento ou lazer? Por fim, nos parece que o atleta de e-Sports deve ser registrado como empregado e enquanto não há regulamentação específica devem ser usadas para sua proteção e para a elaboração de contratos de trabalho a Lei Pelé e de forma subsidiária a Consolidação das Leis do Trabalho.
[1] https://rodrigomattos.blogosfera.uol.com.br/2019/12/13/futebol-movimenta-r-53-bi-na-economia-do-brasil-mas-so-gera-1-de-imposto/ – acessado em 23/04/2020
[2] https://www.uol.com.br/esporte/colunas/lei-em-campo/2020/04/01/coronavirus-globo-confirma-suspensao-do-pagamento-dos-direitos-de-tv.htm – acessado em 05/05/2020
[3] Bolsas dos EUA sobem com Amazon e Netflix atingindo recordes – https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/04/16/bolsas-dos-eua-sobem-com-amazon-e-netflix-atingindo-recordes.ghtml – – acessado em 24/04/2020
[4] Seleção Brasileira Anuncia Equipe De E-Sports – https://www.futebolnaveia.com.br/wp/selecao-brasileira-anuncia-equipe-de-e-sports/ — acessado em 27/04/2020
[5] E-sports não é (mais) brincadeira – https://www.istoedinheiro.com.br/e-sports-nao-e-mais-brincadeira/ – -acessado em 28/04/2020.
[6] FORTNITE FOI O GAME GRATUITO MAIS RENTÁVEL DE 2019, APONTA PESQUISA – https://vs.com.br/artigo/fortnite-foi-o-game-gratuito-mais-rentavel-de-2019-veja-lista-completa – – acessado em 28/04/2020
[8] ‘Awful Business’ Or The New Gold Rush? The Most Valuable Companies In Esports Are Surging -https://www.forbes.com/sites/christinasettimi/2019/11/05/awful-business-or-the-new-gold-rush-the-most-valuable-companies-in-esports-are-surging/#6e9773c1324d – – acessado em 28/04/2020
O Governo do Estado de São Paulo montou uma operação de guerra para tentar defender o aumento do ICMS que promoveu no Estado, a partir de questionável delegação de poderes da Assembleia Legislativa para o Governador.
Sobre um bem articulado discurso de necessidade de recursos para fazer frente aos efeitos da pandemia, o Governo Estadual, com ajuda da Assembleia, aumentou o ICMS de vários setores e produtos.
Em português claro: O governo estadual passou a boiada. Legislou no atacado a partir dos Poderes especiais que lhe foram outorgados, fechando os olhos e ouvidos para a particularidade de cada um dos setores envolvidos.
A reação não poderia ser outra. Diversas ações judiciais e movimentos sociais contrários à medida imposta a partir da publicação da Lei 17.293/20 e dos Decretos 65.255/20 e 65.454/20.
O Poder Judiciário provocado por diversos setores a se manifestar, passou a suspender por liminares a eficácia normativa dos instrumentos legislativos que deram vazão à vontade do governo paulista.
Diante deste cenário o Presidente do Tribunal de Justiça foi provocado pelos advogados do Estado, que realizaram o pouco usual pedido de suspensão das liminares concedidas1.
Não é de surpreender que o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, através de ato do seu Presidente, houve por fazer uso de legislação que foi criada visando restringir o cabimento de liminares contra o Poder Público com a justa intenção de proteger o interesse público2 e suspendeu as diversas liminares concedidas contra a “reforma tributária estadual”.
Digo que não é de surpreender porque é preciso realizar um exercício de empatia quanto a função do magistrado. Ele é posto a decidir sobre tema complexo, a partir do recebimento unilateral de informações, que vociferam a existência de risco de calamidade pública e indicam (mas não provam) que se a reforma feita por decretos não trouxer ao erário os recursos que projetou, haverá caos, riscos ao Estado, impossibilidade de continuidade de funções públicas básicas e essenciais como a saúde, seguridade e segurança de milhões de paulistas.
Nesta posição, em exercício de cognição sumária e limitada, decidiu o que certamente acredita ser o mais razoável. O magistrado atuando em um mundo hipotético onde argumenta-se que o sistema de saúde será pressionado pelo abandono dos planos privados e as escolas públicas serão invadidas pela evasão das escolas privadas em decorrência do desemprego causado pela pandemia entre outras mazelas, deliberou por suspender todas as decisões que sustavam o efeito dos decretos estaduais.
E fez isso por pelo menos 3 vezes até a data que esta nota é redigida, atingindo até agora o total de 16 decisões singulares, de juízes que haviam concedido liminares contra o aumento do ICMS no Estado.
Afirmo também que é em certa medida inusitado, porque a proliferação de decisões liminares – um dos efeitos que a decisão do presidente Corte estadual tenta obstar – é um sinal claro e inquestionável de que há problemas com o conjunto normativo que o Poder Executivo implementou no Estado.
Ora, não fosse flagrante a inconstitucionalidade dos Decretos combatidos, porque tantos juízes singulares, de diversas comarcas e varas diferentes dos Fóruns da Fazenda Pública Estadual, estariam concedendo as liminares em favor dos contribuintes? Neste particular, a esses juízes vale uma homenagem pela independência intelectual e funcional, atitudes que renovam a esperança pela entrega de Justiça no Estado.
A decisão do presidente do Tribunal de Justiça que suspendeu as liminares deixa uma porta aberta para a volta à legalidade ao lembrar que “a suspensão da liminar transita em âmbito limitado de conhecimento do litígio”. Até porque, nem precisaria dizer: os instrumentos legais que viabilizam a suspensão das liminares contra o Poder Público e outorgam competência ao presidente do Tribunal de destino dos recursos para declara-la, não podem servir de supedâneo para validar ilegalidades praticadas por outro Poder do Estado, sob o risco de criar o paradoxo inevitável da usurpação da função primeira do Poder Judiciário e de seus magistrados e o desequilíbrio fundamental entre os Poderes da República.
É inquestionável a competência que a legislação confere ao Presidente do Tribunal decidir por suspender as liminares proferidas contra o Poder Público, desde que presentes e comprovados os requisitos legais. Entretanto, juízes singulares e desembargadores do Tribunal de Justiça, acabaram adotando a mesma posição da presidência e passaram a nela fundamentar negativas de concessão de proteção jurisdicional requerida por diversos contribuintes.
Isso seria até natural de compreender se os pedidos que estivessem sendo apresentados ao judiciário, tratassem de situações jurídicas idênticas. Mas não é o caso.
Infelizmente as reformas propostas pelo Governo Estadual atingem a diversos setores e produtos de formas diferentes, e, por conta disso, ao dar o mesmo tratamento para todos, inevitavelmente, o Poder Judiciário Paulista está fazendo letra morta do princípio constitucional e fundamental da igualdade.
Fica muito clara esta situação quando se avalia o aspecto específico concernente ao segmento de veículos usados. Os comerciantes deste segmento estão frontalmente submetidos a dano irreversível, caso o Poder Judiciário continue mantendo – como vem fazendo – válida a tributação indevidamente estabelecida. Explica-se. A Constituição Federal atribui competência à Lei complementar3 para regulamentar a forma como isenções, incentivos e benefícios fiscais devam ser concedidos ou revogados. Com base nesse fundamento constitucional de validade, a Lei complementar 24/75 determinou que eles seriam concedidos ou revogados mediante Convênios entabulados entre Estados e Distrito Federal.
Assim é que há vários anos (1981, 1990, 1992, 1993, 1994)4, o CONFAZ, órgão que reúne as Secretarias de Fazendas dos Estados e do Distrito Federal, consolidou entendimento e estabeleceu diversos convênios para reduzir a base de cálculo do ICMS na saída de máquinas, aparelhos e veículos usados.
A redução que os Estados conferem à base de cálculo do ICMS sobre os veículos usados tem uma razão lógica e técnica, que atribui caráter de necessidade e obrigatoriedade à sua existência e descaracteriza a redução como um “benefício fiscal” comum.
Como é notório, os veículos usados vendidos de consumidores finais ou pessoas físicas aos comerciantes de veículos, não geram crédito do ICMS quando são adquiridos para revenda. Fez-se, por isso, necessária uma alternativa para prestigiar o princípio constitucional da não cumulatividade do ICMS e viabilizar a adequada cobrança de imposto sobre estas operações.
A solução prática com base constitucional encontrada pelos técnicos dos Estados (inclusive os de São Paulo), foi a de adotar redução da base de cálculo do ICMS para veículos usados, de forma que ele incidisse sobre a margem aproximada de revenda deste bem.
Assim, quando o governo do Estado de São Paulo decidiu por Decreto, vigente a partir de 15 de janeiro de 2021, alterar a base de cálculo do ICMS incidente na venda de veículos usados, aumentando a base tributável de 10% do valor da operação para quase 30%5, abandonou a construção técnica que foi elaborada em conjunto com outros Estados há muitos anos.
O argumento do Estado – expressamente manifestado pelo Secretário estadual Mauro Ricardo Machado Costa6 em live realizada no dia 22/02/2020 pelo Jornal “A Tribuna”7 – é que a decisão do Estado foi cortar em 20% linearmente os benefícios fiscais concedidos pelo Estado.
Assim, segundo ele, dado que a redução de base de cálculo classifica-se tecnicamente como benefício, a medida foi necessária. O argumento utiliza a forma e subjuga a essência.
Não se concebe que o Estado ignore o contexto e os efeitos de suas decisões políticas. É dado fático da realidade que os veículos usados não geram créditos de ICMS na entrada dos estabelecimentos comerciantes e é mandatório ajustar essa situação ao princípio da não cumulatividade do tributo.
Ignorar tal fato para, aproveitando-se da forma utilizada para gerar tal ajuste, esquecer-se da substância para a qual a medida foi pensada é um atentado contra a moral pública.
Questionado sobre esse ponto durante a citada live,o Secretário calou-se e insistiu defender a forma sobre a substância, demonstrando que o Estado está satisfeito com perspectiva de ingresso de recursos e nada preocupado com os meios adotados para obtê-los.
No quadro abaixo, fica claro o quão díspar com o restante do país o tratamento tributário para veículos usados que o Estado de São Paulo impôs.
Fonte: Sitio eletrônico das Secretarias de Fazendas Estaduais, consultados no mês de fevereiro 21
O segmento não suporta uma presunção de margem de 30% porque simplesmente ela não existe na operação.
O Estado tem em seu poder os dados dos valores das transações de compra e venda de veículos usados uma vez que a documentação é registrada no órgão Estadual de Trânsito e sabe, comprovadamente, que não existe uma margem de comercialização de 30% ou 20% como impôs por Decretos.
Na verdade, tivesse sido diligente, o administrador público teria certificado que a margem das operações dos comerciantes de veículos usados gira em torno de 10% e, portanto, não deveria ser alterada a tributação que vigorava no Estado até 15 de janeiro de 2021.
A celeuma não teria se instalado.
Não é preciso muita imaginação para desconfiar que mantida a exigência tributária ilegal como o Estado de São Paulo promoveu, inaugura-se uma nova forma de turismo. O turismo tributário. Consumidores de São Paulo dirigindo-se para outros Estados para adquirir veículos.
Este dado por si só já deveria ser suficiente para motivar que o setor de veículos usados fosse destacado do tratamento genérico que as autoridades do Poder Executivo e Judiciário estão dando para o aumento de ICMS no Estado e prontamente suspender a majoração.
Há especificidade suficiente que, ao contrário das decisões que têm sido tomadas pelo Poder Judiciário, coloca o setor em evidente defesa do bom direito e com risco real da demora na obtenção da prestação jurisdicional.
Sendo mantida a tributação de veículos usados nos patamares impostos pelos Decretos citados, faz-se letra morta dos princípios constitucionais da não cumulatividade do ICMS8 e da vedação da utilização de tributos com efeitos confiscatórios9.
Acrescente-se a esta dura verdade do setor, todas as demais argumentações referentes a inconstitucionalidade das alterações legislativas promovidas no Estado, que também socorrem ao segmento.
Há clara afronta às Constituições Federal e Estadual e ao Código Tributário Nacional10, que definem como indelegável a competência para legislar sobre tributação, e consequente desafio ao Estado Democrático de Direito, com a relativização da tripartição de poderes11.
Há cristalina afronta ao constitucional e legalmente protegido princípio da estrita legalidade tributária12.
Sabemos que o tempo do direito não é o tempo dos fatos. Mas há situações em que a intervenção do Poder Judiciário deve ser imediata, para afastar e socorrer o administrado contra atos lesivos praticados pelo administrador.
No caso concreto tratado nesse artigo, tardar é falhar contra a própria existência das empresas do setor e, a partir daí, participar de todas as consequências concretas e contra os interesses público e sociais delas advindas.
Luiz Eduardo Vidigal Lopes da Silva
Advogado, especialista em direito constitucional, pós graduado em direito tributário e mestre em direito pela FGV. Sócio deLSA – Lopes da Silva & Associados advogados , focado no segmento da distribuição automotiva. E-mail: luizeduardo@lopesdasilva.adv.br
1 Processo em trâmite perante o TJ SP nº: 2004492-69.2021.8.26.0000.
2 Leis nº 12.016/2009; 8.437/1992; 9.494/1997.
3 Art. 155, § 2º, VII, letra g da Constituição Federal
De acordo com a Lei 13.709/18 – Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), em especial seu artigo 7º, o tratamento de dados pessoais somente poderá ser realizado para uma finalidade específica de tratamento e se esta finalidade estiver apoiada em uma das 10 Bases Legais.
Dentre as Bases Legais elencadas na LGPD destacamos a Base Legal do Legítimo Interesse – que nada mais é do que a possibilidade do tratamento de dados pessoais para atender aos interesses legítimos do Controlador ou de terceiros para finalidades legítimas:
de apoio e promoção de suas atividades;
proteção do titular, do exercício regular dos seus direitos ou prestação de serviços que beneficiem o titular dos dados, respeitadas suas legítimas expectativas e seus direitos e liberdades fundamentais.
A utilização desta Base Legal do Legítimo Interesse deve ser cuidadosamente analisada pelo Controlador dos dados na sua situação concreta, balanceando os interesses do Controlador com os direitos e liberdades fundamentais do titular dos dados.
Ela não é uma Base Legal Coringa!!! Ela não pode substituir qualquer outra Base Legal ou ser utilizada indiscriminadamente em qualquer situação ou em qualquer finalidade de tratamento dos dados.
A LGPD não dispõe a fundo sobre as diretrizes que devem ser adotadas pelas empresas para utilização desta Base Legal e muito do que temos visto está baseado na experiência da Europa. O Information Commissioner’s Office (ICO), uma autoridade independente do Reino Unido, recomenda a elaboração de um Teste do Legítimo Interesse (Legitimate Interests Assessment- LIA) para balancear, de um lado, os interesses do Controlador e, de outro lado, os Direitos e Liberdades Fundamentais do Titular dos Dados.
Assim, para que a Base Legal do Legítimo Interesse seja utilizada pela empresa de maneira consistente o Teste do Legítimo Interesse deverá ser aplicado a cada uma das finalidades de tratamento dos dados.
No que consiste este Teste do Legítimo Interesse? Este teste é feito em quatro fases:
Primeira fase do Teste – Legitimidade do Interesse – consiste na verificação se o interesse do Controlador de fato é legítimo e se existe alguma legislação que proíba o tratamento (artigo 10º – caput da LGPD).
Exemplo: Analisar que não existe legislação que proíba a realização de propaganda pela Concessionária através de email marketing para o titular de dados (consumidor) que já adquiriu veículos na Concessionária ou já manifestou interesse em adquirir veículos.
Segunda fase do Teste – Necessidade – Verificação, pelo Controlador, da necessidade de utilização do dado pessoal para aquela finalidade do tratamento do dado (artigo 10º, parágrafo 1º da LGPD).
Exemplo: para enviar o email marketing preciso utilizar o email do titular do dado? Sim, para enviar o email marketing é necessária a utilização do email do titular.
Terceira fase do Teste – Balanceamento – Consiste no balanceamento e verificação da legítima expectativa do titular dos dados e os interesses do Controlador. A empresa não deverá ferir nenhum dos direitos do titular, mas ao mesmo tempo deve prestar atenção às suas atividades e interesses (artigo 10º, II da LGPD).
Exemplo: O Controlador deve analisar se o titular do dado, ao receber o email marketing da Concessionária, achará aquele recebimento estranho ou não, ou seja, se o titular do dado alguma vez fez contato com a Concessionária ele não estranhará ao receber referida propaganda, ele tem uma expectativa do recebimento já que a empresa não lhe é estranha, pois em outra oportunidade seus dados já foram entregues para a Concessionária.
Quarta fase do Teste – Salvaguardas – Esta fase do Teste do Legítimo Interesse deverá ser utilizada para a empresa verificar internamente se os titulares dos dados podem exercer seus direitos (“optout”, oposição, etc.) e que a empresa verifique também que serão adotadas medidas para garantir a transparência do tratamento dos dados (artigo 10º, parágrafos 1º e 2º da LGPD).
Exemplo: no caso analisado podemos colocar que o controlador deverá garantir medidas que possibilitem ao titular dos dados solicitar seu “optout” parando de receber o email marketing.
A experiência europeia demonstra que feito o Teste do Legítimo Interesse e passando em todas as etapas, a empresa poderá utilizar a base legal do Legítimo Interesse. Vale colocar que o Teste deverá ficar armazenado na empresa, independentemente de o resultado ser positivo ou negativo para utilização da referida base.
Outro aspecto importante sobre o Legítimo Interesse é que, de acordo com a LGPD, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados poderá solicitar ao Controlador Relatório de Impacto à Proteção de Dados Pessoais, quando o tratamento estiver fundamento no Legítimo Interesse, observados os segredos comercial e industrial (artigo 10º, parágrafo 3º da LGPD).
O Relatório de Impacto à Proteção de Dados Pessoais – também conhecido como Data Protection Impact Assessment (DPIA), conforme disposto na LGPD deverá conter, no mínimo, a descrição dos tipos de dados coletados, a metodologia utilizada para a coleta dos dados e para a garantia da segurança das informações e a análise do controlador com relação a medidas, salvaguardas e mecanismos de mitigação de risco adotados. (parágrafo único do artigo 38 da LGPD)
Por fim, apesar das empresas utilizarem o direcionamento vindo da Europa sobre a utilização da Base Legal do Legítimo Interesse, nos próximos meses a Autoridade Nacional de Proteção de Dados – ANPD – deverá se posicionar quanto à utilização desta Base Legal de forma que tenhamos um direcionamento mais claro e dirigido às atividades das empresas no Brasil.
A grande pergunta que temos recebido é: Afinal, quando a LGPD (Lei 13.709/18) entrará em vigor?
Primeiramente, importante colocar que quando da publicação da LGPD, em 2018, a vigência da Lei iniciaria em fevereiro de 2020. Posteriormente foi alterada passando sua vigência a iniciar em agosto de 2020.
Por meio da Medida Provisória 959/20 fomos surpreendidos com outra prorrogação de sua vigência para maio de 2021. A Medida Provisória produz efeitos jurídicos imediatos, mas esta prorrogação ainda não é definitiva tendo em vista que a Medida precisa de apreciação do Congresso Nacional para se converter definitivamente em lei ordinária. No último dia 12 de junho foi publicada a Lei nº 14.010/20 com a prorrogação da vigência das sanções da LGPD (Art. 52 a 54) para agosto de 2021.
Diante de todas essas prorrogações e publicações, atualmente existe uma dificuldade grande para afirmar qual a data de entrada em vigor da LGPD em face de 4 cenários possíveis quanto ao início da vigência senão vejamos:
Cenário atual
LGPD entra em vigor em 03 de maio de 2021 com as sanções aplicáveis a partir de 01 de agosto de 2021.
Cenários futuros
LGPD entra em vigor em 16.08.2020, com as sanções em agosto de 2021, se a MP 959 caducar;
LGPD e sanções em vigor em maio de 2021 se a MP 959 for aprovada na íntegra; e
Se a MP 959 for alterada não temos como prever o que acontecerá
De acordo com o cenário atual, com a LGPD entrando em vigor em 03 de maio de 2021, nos dá a sensação de que ganhamos mais tempo para ficar em conformidade com a Lei, mas esta é uma falsa sensação, vez que muito trabalho deve ser realizado para que as Concessionárias fiquem em conformidade com os aspectos previstos na legislação.
As mudanças internas serão grandes desafios para as Concessionárias, a começar pela mudança cultural, os empregados e prestadores de serviços, que tem acesso aos dados pessoais, devem passar por um processo de aculturamento, devem conhecer o que dispõe a legislação. Os treinamentos serão muito importantes nesta trajetória.
Em linhas gerais, dentre diversas adequações necessárias, inclusive em sistemas, ressaltamos a necessidade de a Concessionária realizar um levantamento de dados de todas as suas operações para identificação e mapeamento do fluxo dos dados pessoais, identificando suas vulnerabilidades de segurança, sua finalidade, as bases de dados que justificam cada tratamento bem como a forma de atendimento aos direitos dos titulares tais como acesso aos seus dados, retificação, exclusão, revogação de consentimento, entre outros.
Importante também que a Concessionária revisite sua política de privacidade para verificar se está em conformidade com a LGPD e caso não possua uma política deverá elaborar uma. O mesmo deverá ser feito para política de “cookies”, termo de uso de seu site entre outras políticas internas e externas da empresa. Tudo deve ser adequado.
Todos os contratos da empresa, inclusive os contratos de trabalho, devem ser revisitados e analisados para cumprimento das normas da proteção dos dados pessoais, inclusive quanto ao sigilo e confidencialidade das informações.
De modo geral, percebe-se a grande quantidade de trabalho e adequações que deverão ser realizadas para que a Concessionária esteja em conformidade com a Lei. O momento para começar é agora e demandará tempo.
No cenário atual, as sanções serão aplicáveis a partir de 01 de agosto de 2021 e a empresa que não estiver em conformidade com a Lei estará sujeita, em caso de descumprimento da LGPD, à multa que pode chegar a 2% do faturamento da empresa até o limite de R$ 50 milhões por infração, restando ainda a possibilidade da multa diária.
De tudo quanto foi colocado, entendemos que os trabalhos de implantação das disposições da LGPD devem começar imediatamente, com a análise e revisão dos procedimentos internos e posterior definição e realização das mudanças que vierem a ser necessárias.
Dúvida que vem surgindo na cabeça de muitos diz respeito à possibilidade de o empregador obrigar seus empregados a tomarem vacinas, especialmente contra a Covid-19, assim que a mesma estiver disponível e qual(is) providência(s) pode tomar em caso de recusa.
Evidentemente, para externar nossa opinião, partimos de dois pressupostos, quais sejam (i) há vacina contra Covid-19 e a mesma foi aprovada pelos órgãos competentes e (ii) não há risco de vida ao empregado que for vacinado, ou seja, não levaremos em conta em nossa análise, aquele empregado que, por motivos de sua própria saúde, não possa tomar a vacina (por exemplo, alergia a um de seus componentes).
Superados os dois tópicos acima, a análise da questão suscitada passa por dois pontos específicos, quais sejam, (i) a possibilidade ou não por parte da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e (ii) da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) para a obrigatoriedade da aplicação da vacina.
Em relação à questão legal, desde logo ressaltamos que não há legislação específica sobre o tema (legislação trabalhista, regulando a relação entre empregado e empregador), entretanto há regras de caráter geral e ainda houve decisão do STF que embasa nossa resposta, ressalvando entendimentos em sentido contrário.
De início, devemos destacar que há dois dispositivos legais que tratam da obrigatoriedade da vacinação a toda a população (o art. 3º da Lei nº 6259/752, de 30 de outubro de 1975 e o art. 3º da Lei nº13979/203), sendo que o primeiro diz respeito à vacinação em geral e o segundo especificamente em relação à Covid-19.
Assim, o próprio Poder Público tem a obrigação de criar programas de vacinação obrigatória para toda a população. E a vacinação é obrigatória, pois diz respeito ao cuidado da saúde da sociedade como um todo e não de cada indivíduo de forma isolada.
E para o empregador, ao nosso sentir, a situação não é diferente, na medida em que ele deve zelar para que todos os seus empregados sejam vacinados, a fim de garantir a saúde e bem estar de toda a coletividade dos seus trabalhadores.
Mas cabe ressaltar que, nos termos do quanto decidido pelo STF, que obrigatoriedade não significa vacinação forçada. Ou seja, ela pode ser obrigatória, mas ninguém pode ser forçado a tomar a vacina contra sua vontade.
A decisão exarada pelo STF na ADI 6587, que tratava da vacinação obrigatória é clara ao fixar que:
“(I) A vacinação compulsória não significa vacinação forçada, porquanto facultada sempre a recusa do usuário, podendo, contudo, ser implementada por meio de medidas indiretas (…)”
(grifos nossos)
Dessa forma, o STF decidiu que não se pode forçar o indivíduo à vacinação, entretanto, pode-se implementar medidas de restrição indiretas, no intuito de persuadi-lo a tomar a vacina. Entendemos que no âmbito da relação de trabalho se verifica a mesma hipótese.
Pois bem, tanto a Constituição Federal (CF), quanto a CLT e algumas outras leis, definem direitos à segurança e saúde do empregado, restando ao empregador o dever de garantir a segurança e a saúde dos empregados no ambiente de trabalho.
As Normas que levam à essa obrigação do empregador zelar pela saúde do empregado são muitas, dentre as quais podemos destacar os arts. 157 e 158 da CLT, o art. 19 da Lei nº 8213/91, o art. 3º-J da Lei nº 13979/2020. Além desses, há regras postas nas Normas Regulamentadoras (NR) que tratam das condições de trabalho, que, da mesma forma, impõe ao empregador a obrigação de zelar pela saúde de seus empregados e impõe a esses trabalhadores o dever de respeitar e cumprir as normas impostas pelo Poder Público e pelo empregador (p.e., NR-1 e NR-9).
Os arts. 157 e 158 da CLT preveem, em resumo, que cabe às empresas zelar pela saúde do trabalhador, cumprindo as normas relativas à segurança do trabalho, inclusive instruindo os empregados em relação às precauções que devem ser tomadas para evitar acidentes ou doenças do trabalho e a obrigação do empregado em seguir trais regras. Veja que em sua parte final, o art. 158 estabelece que se constitui em ato faltoso do empregado a recusa injustificada a recusa ao cumprimento das instruções do empregador e o uso dos Equipamentos de Proteção.
O § 1º do art. 19 da Lei 8213/91 prevê que “a empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador”.
Por sua vez, o art. 3º-J da Lei nº 13.979/2020 prevê que “durante a emergência de saúde pública decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019, o poder público e os empregadores ou contratantes adotarão, imediatamente, medidas para preservar a saúde e a vida de todos os profissionais considerados essenciais ao controle de doenças e à manutenção da ordem pública”.
Portanto, tem-se clara a obrigação da empresa de cuidar da saúde do empregado, mas, ao mesmo tempo, tem-se igualmente clara a obrigação do empregado de zelar pela sua própria saúde, inclusive obedecendo às ordens do empregador nesse sentido.
É de se destacar que os dispositivos em comento impõem ao empregador a obrigação de zelar pela saúde de seus empregados, não apenas individualmente, mas de toda a coletividade e impõe, ainda aos empregados a obrigação de cumprir as normas relacionadas à sua segurança e saúde e de toda a coletividade, não apenas por si, mas também para preservar a saúde de seus pares.
Assim, entendemos que uma vez disponibilizada a vacina contra a Covid-19, ela pode ser exigida para todos os empregados (excetuado, como dito anteriormente, aqueles que por questões de sua própria saúde, não puderem toma-la). Mas, na linha do decidido pelo STF, ela pode ser exigida, mas o empregado não pode ser forçado a toma-la.
Posto de outra forma, entendemos que não é possível exigir a obrigatoriedade da vacina (não se pode forçar o empregado a tomar a vacina), entretanto, a fim de resguardar a integridade física, a saúde e a segurança do conjunto de empregados entendemos ser possível requisitar a comprovação da vacinação do empregado e, caso o mesmo não tenha tomado a vacina, se pode efetuar diversos tipos de restrições, inclusive o impedimento do empregado de frequentar o local de trabalho, chegando, inclusive à rescisão contratual por justa causa.
Entretanto, reputamos que a aplicação da justa causa não deve se dar de pronto, com a simples recusa. Entendemos que é obrigação do empregador (inclusive em face das disposições do inciso II do art. 157 da CLT), primeiramente conscientizar seus empregados da necessidade de vacinação, não só para preservação de sua própria saúde, como de seus familiares e colegas de trabalho.
Assim sendo, caso o empregado não tome a vacina, o empregador deve tentar persuadi-lo a se vacinar, demonstrando os benefícios da vacinação para o próprio trabalhador, como de seus colegas de trabalho e de toda a sociedade.
Caso, ainda assim o empregado se recuse a tomar a vacina reputamos, então, ser possível a dispensa por justa causa, por descumprimento de ordem do empregador e descumprimento do já citado art. 158 da CLT, lembrando que o parágrafo único do mesmo artigo reputa ato faltoso a recusa do empregado em obedecer às ordens relativas à segurança e saúde do trabalhador.
O próprio Ministério Público do Trabalho editou “Guia Técnico Interno do MPT Sobre Vacinação da Covid – 19”4em que reconhece a possibilidade da dispensa por justa causa dos empregados que se recusarem a tomar a vacina, ressalvando, na mesma linha do quanto afirmamos aqui, que a justa causa deve ser a última medida, sempre precedida de orientação ao empregado e tentativa de persuasão para que ele tome a vacina.
Em conclusão, entendemos, respeitando, repita-se, pensamentos contrários, que a vacinação é obrigatória, mas não pode ser forçada, cabendo ao empregador, primeiramente orientar todos os seus empregados a tomarem a vacina “fornecendo todas as informações necessárias para elucidação a respeito do procedimento de vacinação e das consequências jurídicas da recusa” e, caso persista a recusa poderá ser realizada a dispensa por justa causa do empregado, a fim de manter o bem estar de toda a coletividade dos trabalhadores.
1Sérgio Schwartsman, Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Sócio Coordenador da área trabalhista de Lopes da Silva & Associados – Sociedade de Advogados – LEXNET São Paulo, pós-graduado em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho
2 “Art. 3º – Cabe ao Ministério da Saúde a elaboração do Programa Nacional de Imunizações, que definirá as vacinações, inclusive as de caráter obrigatório” – grifamos.
3 “Art. 3º – Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional de que trata esta Lei, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, entre outras, as seguintes medidas:
No último dia 29 de abril de 2020 o Supremo Tribunal Federal (STF) apreciou, em conjunto, diversas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) que discutiam a Medida Provisória (MP) nº 927.
As ADIs foram as de nºs 6.342, 6.344, 6.346, 6.348, 6.349, 6.352 e 6.354, que alegava inconstitucionalidade de diversos artigos da MP em referência.
Inicialmente o Relator, Ministro Marco Aurélio, havia negado as liminares em todas as ações, mas determinando que as mesmas fossem reapreciadas pelo Pleno do STF, o que ocorreu, como dissemos, no último dia 29 de abril.
A decisão desse referendo foi no sentido de considerar válidas quase todas as disposições da MP nº 927, com exceção de dois dispositivos, quais sejam, os arts. 29 e 31, mas que não alteram a essência da norma, mantendo-se as suas regras mais relevantes, especialmente aquelas que visam criar alternativas para redução da circulação de pessoas, especialmente para reduzir a prorrogação da Covid 19; redução de custos e, principalmente, as que visam a criação de alternativas para manutenção dos empregos.
A MP estabelece, a nosso ver, como questão principal, que “para enfrentamento dos efeitos econômicos decorrentes do estado de calamidade pública e para preservação do emprego e da renda, poderão ser adotadas pelos empregadores, dentre outras, as seguintes medidas, (i) o teletrabalho, (ii) antecipação de férias individuais, (iii) a concessão de férias coletivas, (iv) o aproveitamento e a antecipação de feriados, (v) o banco de horas, (vi) a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho, (vii) o direcionamento do trabalhador para qualificação e (viii) o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS.
Todas essas regras foram tidas como constitucionais e mantidas em vigor, de tal sorte que podem ser adotadas, por empregadores e empregados, a fim de tentar diminuir a disseminação do vírus e ainda evitar as dispensas, diante da significativa retração da economia. Esse é o foco principal da MP e foi mantido intacto.
Com a suspensão de apenas os dois artigos indicados acima, manteve-se, portanto, todos os demais, especialmente o art. 2º que estabelece que:
“Art. 2º – Durante o estado de calamidade pública a que se refere o art. 1º, o empregado e o empregador poderão celebrar acordo individual escrito, a fim de garantir a permanência do vínculo empregatício, que terá preponderância sobre os demais instrumentos normativos, legais e negociais, respeitados os limites estabelecidos na Constituição”
(destacamos)
Tal regra é de suma importância para agilizar a tomada de decisões nesse momento de crise (especialmente porque as discussões em nível coletivo tendem a ser mais demoradas, correndo o risco de se tornarem ineficientes), sempre visando garantir a manutenção do emprego. Não se trata de salvo conduto para prejudicar o trabalhador e lhe retirar direitos, mas sim de mecanismo para as partes (empregadores e empregados) dialogarem a fim de encontrar a melhor solução para a manutenção das relações empregatícias, visando evitar as dispensas dos empregados.
É extremamente relevante destacar que foi concedida validade a esse artigo, que permite o Acordo Individual, com prevalência sobre outros instrumentos normativos, em especial as Normas Coletivas, MAS DEVEM SER RESPEITADOS OS LIMITES CONSTITUCIONAIS.
Os dispositivos que foram suspensos, como já dissemos, são os arts. 29 e 31, que estavam redigidos nos seguintes termos:
“Art. 29. Os casos de contaminação pelo coronavírus (covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal”.
“Art. 31. Durante o período de cento e oitenta dias, contado da data de entrada em vigor desta Medida Provisória, os Auditores Fiscais do Trabalho do Ministério da Economia atuarão de maneira orientadora, exceto quanto às seguintes irregularidades:
I – falta de registro de empregado, a partir de denúncias;
II – situações de grave e iminente risco, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas à configuração da situação;
III – ocorrência de acidente de trabalho fatal apurado por meio de procedimento fiscal de análise de acidente, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas às causas do acidente; e
IV – trabalho em condições análogas às de escravo ou trabalho infantil”.
O art. 29 estabelecia, como regra, que a contaminação pelo coronavírus não seria considerada como doença profissional, exceto mediante comprovação do nexo causal, ou seja, se ficasse comprovado que a contaminação se deu no exercício do trabalho.
Com todo respeito e acatamento, reputamos que a suspensão desse dispositivo legal traz pouco, ou nenhum, efeito prático.
Ora, já estava estabelecido que se ficasse provado o nexo causal da doença com as atividades do empregado, a Covid 19 seria considerada doença profissional (era a exceção da parte final do artigo). Com a suspensão desse artigo, não há mais essa previsão da MP nº 927, de modo que vamos para a regra geral, qual seja, doença profissional é aquela adquirida no exercício do trabalho, de modo que, ainda pela regra geral, deve ser comprovado o nexo causal entre a doença e as atividades desenvolvidas.
Ou seja, “trocou-se seis por meia dúzia e para seis novamente”, pois, antes da MP nº 927, para se doença profissional, já devia haver comprovação de nexo entre a doença e o trabalho, com a redação do art. 29 da MP nº 927, ficou mantida a regra de que, se provado o nexo da doença com o trabalho, seria reputada como doença profissional e agora, com a suspensão do art. 29, voltou à regra original de que, deve haver comprovação de nexo entre a doença e o trabalho para que seja reputada doença profissional.
Já em relação ao art. 31 da MP nº 927, ainda nos parece que a sua suspensão traz pouco efeito prático, pois as questões mais sérias de violação de direitos trabalhistas (falta de registro, proteção à saúde em face de risco iminente) e até mesmo humanos (por exemplo, trabalho infantil ou em condições análogas à de escravo) já estavam na exceção que permitiam a fiscalização e atuação, se fosse o caso.
Para as demais situações, deveria haver apenas orientação. Mas com a suspensão desse artigo, em tese, os Fiscais, verificando irregularidades, já poderiam lavrar a autuação. Mas aqui duas questões precisam ser levantadas, quais sejam, (i) em face da pandemia e das restrições de circulação, é razoável “colocar os fiscais na rua”, sujeitos à contaminação e/ou transmissão da Covida-19? e (ii) já há a previsão legal (art. 627 da CLT) acerca do critério de dupla visita, ou seja, a primeira é para orientação e determinação para ser sanada eventual irregularidade e somente a segunda com a finalidade punitiva; assim suspenso o art. 31 da MP, se volta a esse regra e, então, a primeira visita deve ter caráter orientativo. Nada muda.
Essas são, a nosso ver, as principais questões a serem destacadas em relação à apreciação feita pelo STF acerca da MP nº 927, especialmente de que na essência, a MP foi tida por constitucional e mantida e aquilo que foi suspenso, pouco ou quase nada a altera.